segunda-feira, 13 de julho de 2020

30 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente

Paulo dos Santos[i]

13 de julho de 1990 é sancionada a Lei Federal nº 8.069, o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA. Fruto de mobilização popular, o Estatuto chega como uma ferramenta importante para a garantia dos direitos de crianças e adolescentes em nosso país.

Dois anos antes, o Congresso Nacional havia promulgado a Constituição Federal de 1988, que já previa, no seu artigo 227 o “dever da família, da sociedade e do Estado assegurar” direitos fundamentais às crianças e aos adolescentes, “com absoluta prioridade”, tais como “o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação,” etc. Ou seja, nos propúnhamos a abandonar um passado em que crianças e adolescentes eram tidos como “menores”, sob a guarda de uma legislação os inferiorizava em relação à cidadania: o Código de Menores.

O ECA fez mais do que romper com aquela legislação atrasada, foi uma busca no sentido de superar a ideia do legislador de que era preciso afastar da sociedade “os menores que infringiam a lei” e puni-los. A mobilização para a criação e sanção do Estatuto, traz a ideia de que uma nova sociedade pode ser gestada a partir do acolhimento, do direito, do reconhecimento de que todas as crianças e todos os adolescentes são pessoas de direitos.

O Sistema de Garantia dos Direitos foi sendo construído e organizado. O entendimento de que era preciso articular e integrar sociedade civil e poder público no sentido de promover, defender e controlar a efetivação dos direitos de crianças e adolescentes foi algo que se tornou manifesto e possível. Conselhos de Direitos, com a função de deliberar sobre a política e de fiscalizar a sua implementação, foram sendo instalados nos municípios, nos estados e na União. Conselhos Tutelares, com a tarefa de salvaguardar direitos e garantir a sua efetivação, foram sendo implantados nas cidades de todo o Brasil.

Novas realidades foram atualizando as práticas. O Conselho Tutelar passou a ser um órgão eleito por todos os moradores das cidades com direito ao voto. Os Conselhos de Direitos passaram a ser figura protagonista da política. Os municípios começaram a lidar com a ideia de um Fundo único e exclusivo para gerir a política pública. Conferências nos três níveis da federação foram fundamentais para mobilizar os mais diversos atores, sobretudo as próprias crianças e adolescentes. Mais adiante, com toda a reorganização da política de assistência social, passaram a fazer parte dessa rede de proteção os Centros de Referência de Assistência Social – CRAS – e os Centros de Referência Especializado de Assistência Social – CREAS. Ou seja, a partir de 1990, a política foi sendo atualizada a começar por uma prática que envolvia não somente o poder público, o poder político, mas também organizações não-governamentais e pessoas engajadas na ideia de construir uma sociedade mais justa, igualitária e fraterna.

Por outro lado, sempre houveram aquelas pessoas saudosistas do pensamento repressor, que nunca negaram seu posicionamento retrógrado diante das lutas e da mobilização da sociedade por mais direitos. O Estatuto da Criança e do Adolescente, em não raras vezes, foi atacado, inclusive por parlamentares, como uma legislação “branda e permissiva”. Frentes conservadoras se formavam em defesa da redução da maioridade penal, ou da completa exclusão do Estatuto. O atual presidente da República, inclusive, junta em torno de si todas aquelas pessoas que sempre defenderam a revogação do ECA. Chegou a se ouvir, pelo próprio presidente, quando ainda deputado, que era preciso “jogar o ECA na lata do lixo”. Quer dizer, a implementação do Estatuto da Criança e do Adolescente, bem como a implementação e efetivação dos direitos às crianças e aos adolescentes sempre foi algo de constante luta, e que, por isso mesmo, requereu, e ainda requer, mobilização popular.

Por isso, 30 anos depois, ainda não se tem nada garantido. Ainda precisamos seguir mobilizados. Os Conselhos de Direitos, nesse momento, precisam ser um canal de resistência. Seus assentos devem ser ocupados pela sociedade civil, com vigor. As crianças e os adolescentes precisam entrar nas suas plenárias, gritar pelos seus direitos, e aos conselheiros e às conselheiras, lhes cabe abrir os microfones e lhes amplificar ainda mais a voz. Os Conselhos Tutelares precisam estar altamente comprometidos com a luta daquelas e daqueles que não se dobram diante das injustiças. Os Conselheiros Tutelares precisam estar junto das crianças e dos adolescentes para lhes garantir que nenhum direito seja violado e que o poder público seja responsabilizado por quaisquer práticas que atentem contra o legislado.

São 30 anos. E são momentos de constante mobilização. Não baixaremos a guarda!



[i] Paulo dos Santos é Cientista Social/UFRGS, mestrando em Ciência Política pelo Programa de Pós-Graduação/UFRGS, ex-presidente do Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente de Sapucaia do Sul e Secretário de Formação e Educação Política do PT Sapucaia do Sul.

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